quarta-feira, 25 de abril de 2012

Qual o momento mais importante do culto?


Os pentecostais dirão que é o momento da oração por cura, com sinais e maravilhas. Os neopentecostais dirão que é o momento das ofertas (!). Os conservadores dirão que é a adoração ou a pregação da Palavra. Confesso que durante mais de trinta anos acreditei que o momento da mensagem era o mais sagrado do culto, quando Deus fala por meio do pregador. O próprio Spourgeon, considerado o “príncipe dos pregadores” fez menção do púlpito como “o lugar mais sagrado depois do Trono de Deus”. Um mínimo de conhecimento da história eclesiástica nos leva a entender o importantíssimo papel do púlpito em salva guardar a sã doutrina e a pureza do “kerigma”. De uns anos para cá passei a suspeitar desse pensamento e a questionar se realmente é o que a Bíblia diz.
 
Que dizem as Escrituras?
Se formos honestos em nosso exame das Escrituras, teremos que admitir que o sermão (ou a mensagem) tal qual o entendemos hoje, como uma peça manufaturada, com introdução, tese, divisões, conclusão, aplicação e apelo, não parece ter o peso que os teólogos modernos lhe outorgaram. Se tomarmos como ponto de partida o ministério de Jesus, veremos que seus sermões ocorriam conforme a necessidade. Eram espontâneos, abertos a colocações dos ouvintes e até indagações. No demais, como Rabi, ficava no meio de uma roda de “alunos” e ali compartilhava assuntos do cotidiano e respondia perguntas. Geralmente, após dar respostas às indagações capciosas aos fariseus, Jesus empreendia um discurso que trazia luz e revelação sobre o assunto em questão. Porém, não trazia notas ou esboços. Falava do púlpito do seu coração.

Que diz a história?
Durante a história da igreja, temos mais recursos para presumir que o sermão era o ponto alto das reuniões devido aos sermões de Pedro, de Estêvão e de Paulo. Posteriormente, os pais apologistas, com suas brilhantes obras em defesa da fé, contribuíram em muito para o desenvolvimento do atual “sermão de três pontos”, tido como algo sagrado nos meios conservadores. Os grandes avivamentos, tanto na Europa quanto nos EUA, foram dirigidos por eloquentes pregadores e seus sermões que se transformaram em obras de referência até os dias atuais. Seria também uma grande falha não nos lembrarmos de Billy Graham, o “evangelista do século XX” e suas mensagens inflamadas pregadas nos quatro cantos da Terra. Mas tudo isso, mesmo sendo história, não altera o fato de que o sermão pode não ser o ponto alto de um culto ou reunião cristã.

Culto ou reunião?
A expressão “culto”  parece não ser de origem cristã, visto que os termos hebraico e grego  (Ìabowdah e latreia)  referem-se a “serviço prestado”. A expressão “culto”  parece ter origem no paganismo e provavelmente foi incorporada à igreja cristã após a Reforma do século XVI, numa espécie de substituição à Missa. O que vemos na prática cristã é a expressão “sunerchomai” (1ª Co 11:18) e “episunagoge” (Hb 10:25) , ambas referindo-se à “uma reunião”, como as de serviço, de amigos ou de família. Na verdade, em reuniões menores, o sermão perde sentido, sendo que, o que fala expõe um assunto de modo informal, aberto a debate, firmando suas opiniões num texto comum: a Bíblia.

Mudar? Mas... agora?
Não acho que devemos abolir nossas reuniões dominicais ou eliminar por completo a pregação de nossa liturgia. Isso pioraria a situação que já é ruim. Creio que o que podemos fazer, em curto prazo, e assumir a grande verdade: o sermão não pode, nem deve ser considerado o ponto alto do serviço prestado à Deus no domingo, e sim, a manifestação do Espírito. Como assim? “ O sermão é tão central que muitos cristãos vão a igreja por causa dele. Na verdade, todo culto é julgado pela qualidade do sermão. Pergunte a alguém como foi a igreja no último domingo e provavelmente receberá uma  resposta descrevendo a mensagem” (*) .
Deus manifestando-se estre seu povo deveria ser o ponto alto do culto e não a pregação, e isso pode ocorrer no início, no meio ou no fim da reunião. Deus pode manifestar-se durante a pregação, ou durante a oração final, ou durante os louvores, mas não é porque o pastor é o presidente da igreja e o detentor da palavra, que necessariamente Deus se manifestará unicamente por meio dele. A liberdade do Espírito deve ser preservada, pois o que não é feito no Espírito não merece ser feito.

A centralidade da Palavra.
Ter a Palavra de Deus, a Bíblia, como centro gravitacional do ensino na igreja não significa necessariamente que o serviço dominical prestado à Deus tenha que ter a pregação como ponto alto. A Escola Dominical se presta ao ensino e deve ser fortalecida cada vez mais no meio evangélico. Classes pequenas, com, no máximo vinte alunos, num círculo, debatendo temas atuais ou estudando um livro da Bíblia, são excelentes oportunidades de centralizar a Palavra, Mas o culto dominical não deve ser uma homilia nem um show de “stand-up” cristão.
Sou pregador, esse é meu chamado. Preparo-me para expor a Palavra de Deus dominicalmente e o faço com cuidado e amor. Todos esperam esse momento tanto quanto eu. Mas Deus sabe que não me arrogo a pensar que serei o protagonista do que há de melhor no culto.
Como disse A. W. Tozer, “é difícil levar uma pessoa a lugares onde a única atração seja Deus”. Enquanto Deus não for a única atração em nossos cultos, não estaremos, de fato, prestando culto à Deus.

SÉRGIO MARCOS

(*)  Frank Viola e George Barna – CRISTIANISMO PAGÃO? – Abba Press - pág. 148

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Caio Fábio? Qual deles?



Caio Fábio D’Araújo Filho ainda é uma das principais personalidades do universo cristão contemporâneo, conhecido  no Brasil e no exterior.
Não é para menos. Com um ministério evangelístico extraordinário, dono de uma oratória diferenciada devido à erudição aliada à espiritualidade, foi amado por pentecostais e tradicionais, tendo sido considerado um verdadeiro porta-voz da igreja evangélica brasileira. Um Francis Shaeffer tupiniquim, um Billy Graham brasileiro como queriam alguns.
Não foi o caso...
Após a criação da VINDE – Visão Nacional de Evangelização, que o levou a realizar inúmeras cruzadas evangelísticas por todo o Brasil, a publicar dezenas de livros e edificar um dos maiores complexos assistenciais da América Latina, A Fábrica de Esperança, foi envolvido (ou envolveu-se?) no escândalo do “Dossiê Caimã”, de falsas denúncias contra o então Presidente Fernando Henrique Cardoso e, posteriormente, em episódio de conduta sexual extraconjugal que culminou com o término do casamento com Alda, sua esposa, o que gerou profunda dor em todos que o admiravam.

Quantos “Caios Fábios” existem?
Atualmente Caio Fábio lidera um movimento chamado “Caminho da Graça” que muitos definem como uma igreja emergente (ou alternativa), mas longe de ser o flamejante pregador de meados dos anos 70 até o final dos anos 90.
O que quero dizer com “Caio Fábio, qual deles?”. Identifico em sua vida três fases: 1) o pregador e líder cristão notável, 2) o servo arrependido e disposto a recomeçar e 3) o líder “alternativo’ de hoje.
Minhas considerações não visam atingir a pessoa de Caio. Seria muita pretensão! Até por que o mesmo considera-se muito bem resolvido e decidido a permanecer no cenário emergente com uma mensagem diferente da que pregou por tantos anos.
Minha intenção é levar à reflexão pessoas que o conheceram no passado e estão confusas diante do Caio Fábio atual, colocando-as diante destes três momentos a fim de que possam distinguir o caminho da graça de Deus do caminho da graça “segundo Caio Fábio”.

Pregador e líder inter-denominacional.
Caio teve uma carreira ministerial meteórica. Inserido numa grande e respeitada denominação, foi incentivado a ir além dos limites denominacionais. Escritor profícuo, também dirigiu vários congressos com ênfase na ética ministerial, espiritualidade, integridade cristã e vida familiar. Suas pregações (em fitas cassetes na época) espalharam-se por todo território nacional. Conheço pessoas que chegaram a ouvir a mesma mensagem várias vezes, tamanha era a unção com que ministrava. Expunha o Novo Testamento com maestria e seu tema central sempre foi JESUS. Um de seus trabalhos mais bem escritos (segundo meu ponto de vista) foi o opúsculo: “Seguir Jesus: o mais fascinante projeto de vida”. Esse Caio Fábio dedicou-se a uma Igreja (não à denominação) que não o merecia, e foi engolido pelo sistema evangelicalista. Transformado “em coisa”, foi um depósito de ética a um povo que mal sabia o que essa palavra significava. Içado a uma posição acima de sua humanidade, sucumbiu desgraçadamente, sendo vitima e vilão de si mesmo.

Arrependido e disposto a recomeçar.
Após a divulgação do triste episódio, que demorei a acreditar ser verdadeiro (e não somente eu, mas milhares de pessoas que o admiravam), refugiou-se nos Estados Unidos de onde concedeu uma entrevista a Revista Vinde, cujo exemplar possuo até hoje: Ano IV – Nº 47 – Outubro de 1999.
Nesta entrevista, percebe-se o tom de tristeza, decepção (consigo mesmo) e o desejo de se retratar.
“- Um pastor divorciar-se é triste, mas um pastor como eu se separar por conduta sexual fora do casamento é muito pior”.
Nesta frase é possível perceber que Caio Fábio está consciente do papel que desempenhava no cenário evangélico brasileiro e o tamanho do estrago que seu erro causou. Seus congressos sobre vida familiar eram freqüentados por milhares de pastores e esposas e sua conduta colocou em xeque sua mensagem. Sobre esse assunto, fez o seguinte comentário:
“- A verdade que prego não se tornou menos verdade; ao contrário, voltou-se contra mim e me tratou com imparcialidade”.
Essa lucidez sempre foi uma marca característica, não só do Caio Fábio pregador, mas da pessoa humana que é.
Não posso deixar de fazer mais uma citação, onde Caio deixa evidente um dos seus principais equívocos:
“- Dentro de mim havia uma certeza enorme, mas idiota, arrogante e pecaminosa, de que, se alguém que tivesse que dar a cara ao movimento evangélico no Brasil, que fosse eu, porque me considerava alguém de quem a Igreja não iria se envergonhar”.
Mas este Caio, ainda lúcido e consciente de visibilidade e projeção que possuía, não permaneceria por muito tempo. Um terceiro Caio Fábio estava para surgir, para alegria de uns e perplexidade de outros.

O “terceiro” Caio Fábio.
Em entrevista recente a revista Cristianismo Hoje (Edição 27- Ano 5) com o título, “Eu só quero viver em paz”, Caio foi abordado por retornar à mídia devido a reabertura do processo  “Dossiê Caimã”, do qual foi condenado. Perguntado sobre sua condição na denominação, disse:
“- Eu nunca quis ser pastor ordenado (...). Foi a Igreja Presbiteriana que disse que não era possível que eu fosse considerado pastor... sem ser ordenado e sem aceitar ir para o seminário”.
Mas logo em seguida diz o que (acredito eu) o tornou “o terceiro” desta lista:
“- O que eu não queria, depois do acontecido, era ter que me curvar a nenhum tipo de restauração humana, mentirosa, hipócrita e plástica que queriam me oferecer. Eu sabia que o único a me restaurar era o Senhor. Eu não aceitaria nada que não viesse daquele que me ungiu, sabendo que entrar naquele esquema era vender a minha alma. Então eles aproveitaram essa minha atitude para vender ao povão a idéia de que eu estava rebelado contra a comunhão dos santos e o amor dos irmãos”.
São palavras fortes, mas que trazem nas entrelinhas o estado de espírito que dominou seu coração. Podemos notar uma acentuada diferença entre a entrevista de 1999 e a de 2012. É a mesma pessoa, mas sem dúvida, outro Caio Fábio.

Atualmente.
Bem diferente do segundo, o atual é um crítico mordaz da igreja evangélica e atira em todas as direções. Não consegue separar alhos de bugalhos. Até tenta, mas se tiver liberdade e espaço, não poupa quem quer que seja. Sua linguagem outrora cuidadosa, hoje é recheada de termos chulos, ignorando a advertência paulina em (Ef 4:29 – 5:4 e Tt 2:8). Nem mesmo a recém criada Aliança Evangélica ficou de fora. Sem o menor pudor, chamou seus fundadores de “bundões”, expressão que pode conter inúmeros significados devido ao regionalismo. Polêmico, causou espanto ao  atacar a igreja “Bola de Neve” como ataca a Igreja Universal. Seus pensamentos sobre o movimento gay, masturbação, divórcio entre outros, não são apenas expressão de seu pensamento (hoje bastante heterodoxo), mas ataques frontais com nome e endereço. 
 Recentemente, num talk show da TV brasileira, revelou ao público que aos 7 anos teve "relações" sexuais com uma moça bem mais velha  e que "adorou". Será que o Caio atinou para o fato de que suas palavras poderiam ser entendidas como apologia ao abuso sexual infantil?
Mas Caio ainda possui inúmeros admiradores, sendo que alguns sentem a necessidade de filtrarem seu conteúdo, mas uma parte considerável, bebe a “largos sorvos” desta fonte.

Palavras finais.
Esse artigo, repito, não tem a intenção de atacar Caio Fábio e nem servir “pedras” nas mãos (ou no site/blog) de um franco atirador. Desejo contribuir para que o discernimento espiritual esteja em alta e que sigamos o conselho do apóstolo Paulo: “observe tudo, mas retenha apenas o que for proveitoso”.
Um pastor que cai em imoralidade sexual, não deveria mais exercer o ministério, a bem das ovelhas. Preste atenção: não estou dizendo que pastores divorciados deveriam abandonar o ministério, mas os que caíram em imoralidade sexual. Há casos em que ministros do evangelho foram traídos e abandonados pelas esposas. Não foi o caso do Caio. Poucos autores se atreveram a manifestar suas opiniões sobre o assunto. Só encontrei dois que tiveram esta coragem : Charles Swindow em seu livro “A Noiva de Cristo” (1) e Augustus Nicodemus Lopes em sua obra “O que estão fazendo com a igreja” (2). Não que Deus seja incompetente para restaurar, mas para que o rebanho seja poupado (1ª  Pd 5:3). Respaldar-se no fato de que Davi é considerado um homem segundo o coração de Deus mesmo tendo sido adúltero e homicida, demonstra exegese pobre e completa falta de temor. Após seu pecado, Davi nunca mais foi o mesmo, sofrendo duramente até o dia de sua morte. Além do mais, permaneceu no cargo devido ao sistema monárquico e o profundo grau de arrependimento que demonstrou. Davi pode ser exemplo em muitas áreas, mas na esfera da moral sexual e vida familiar, foi um fracasso.
Sei que meu telhado é de vidro e me preocupo seriamente com minha vida, testemunho cristão e ministério. Li e reli várias vezes o famoso livro de Caio Fábio “A síndrome de Lúcifer”, o qual, a meu ver, foi publicado cedo demais, fazendo com que seu autor se tornasse vítima da mesma síndrome que tão bem discerniu.
Não nos cabe, em absoluto, julgar Caio Fábio: o irmão na fé, o filho de Deus, o crente em Cristo. Mas devemos questionar as reais intenções do ministro, mestre e líder e do conteúdo de seus ensinos. Que esse artigo contribua para isso.

Sérgio Marcos
sergiomarcos59@hotmail.com


Por favor, leia também neste mesmo blog o artigo "Razões por que escrevi o artigo 'Caio Fábio, qual deles', para compreender um pouco mais de minhas motivações. Obrigado.

(1)   Editora Vida
(2)  Editora Mundo Cristão